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Maior desafio foi a preparação técnica dos profissionais

Jorge Menegassi, da Ernst Young: “Contratamos um especialista que tinha acompanhado a transição na Inglaterra”

A preparação técnica de profissionais para o processo de mudança contábil na economia brasileira foi, sem dúvida, o maior desafio das auditorias independentes. Cientes da complexidade que viria pela frente, boa parte delas preferiu antecipar em, no mínimo, quatro anos o início desse treinamento. Por ser um setor de forte concentração de empresas estrangeiras foi de grande ajuda a retaguarda das matrizes e dos escritórios de outros países onde o International Financial Report Standard (IFRS) já havia sido implantado.

Vencida a primeira etapa, e com equipes bem preparadas, as companhias tiveram, e ainda têm, de lidar com o outro lado da moeda: reter seus talentos frente a um maior assédio nessa área que, normalmente, é considerada um celeiro de nomes para o mercado corporativo. Os salários subiram e também aumentaram a complexidade e a exigência de julgamentos mais apurados, com maior tempo de análise. Teve influência a introdução de novas normas para as próprias auditorias. Como resultado, os custos foram pressionados e pesaram no bolso do cliente na hora de contratar o serviço.

Valendo a máxima de que onde há desafio também há oportunidades, as auditorias souberam muito bem aproveitar o momento para ganhar mais espaço e valorização. Na avaliação de Ana Maria Elorrieda, presidente do Instituto dos Auditores Independentes (Ibracon), os auditores contribuíram para que o processo de transição fosse tranquilo e com alto nível de confiabilidade.

Esse movimento coincidiu com o crescimento do setor que já vinha em andamento. Vários fatores favoreceram esse quadro: o cenário macroeconômico, o maior interesse de investidores estrangeiros no país, a busca das empresas pelo Novo Mercado, e fusões e aquisições. Em todos esses casos, o papel do auditor se tornou peça-chave para dar respaldo às apresentações financeiras, uma prática que está deixando de ser majoritariamente das companhias de capital aberto. Não há, entretanto, dados setoriais para indicar quais são as projeções de crescimento para este e os próximos anos.

Essa situação acirrou a concorrência em um mercado que estava acomodado sob o domínio das Big Four (PricewaterhouseCoopers, Deloitte, Ernst & Young e KPMG) e forçou a adoção de ações estratégicas para garantir o crescimento não orgânico. Foi assim que, em menos de um ano, a Ernst&Young, que era a quarta colocada no ranking, se uniu à Terco, somando receita estimada de R$ 650 milhões e passando para a terceira posição, e a KPMG, que perdeu sua posição para a concorrente, adquiriu a operação brasileira da BDO, transação avaliada em R$ 150 milhões.

Para atender ao momento de mudanças contábeis, as táticas adotadas pelas líderes foram semelhantes. Durante um bom tempo equipes, de sócios a técnicos, foram enviadas para cursos, treinamento e troca de experiência em outros países. E também o caminho inverso, com times chegando aos escritórios brasileiros. Até executivos foram “importados”. “Para assumir nossa área de IRFS trouxemos um profissional da Inglaterra (Paul Stucliffe) que já havia acompanhado toda a transição na Inglaterra”, disse Jorge Menegassi, presidente da Ernst & Young Terco.

O esforço não foi pequeno. A Deloitte, por exemplo, criou em 2005 um requerimento para credenciamento de todos os escritórios mundiais, com programa de educação continuada. “O IFRS é mais amplo e mais baseado em conceitos que as normas anteriores. Áreas como consultoria, departamento tributário, e de sistemas tecnológicos, também precisavam entender as mudanças”, disse Vagner Ricardo Alves, sócio da empresa. Na Ernst Young, as rotas de treinamento passaram pelos escritórios na Alemanha, Austrália, Canadá e Inglaterra. Os sócios foram os primeiros a adquirir o conhecimento dessa regras e em 2008, outras equipes de técnicos foram enviadas. A auditoria consolidou sua experiência em um livro, “Manual de Normas Internacionais de Contabilidade- IFRS versus Normas Brasileiras”. “Vendemos mais de 15 mil só no primeiro volume o que, para livros de contabilidade, configura um best-seller”, brincou Menegassi.

O IFRS começou a ser acompanhado pela KPMG no início de sua implantação em outros países. Logo depois, os procedimentos futuros para a preparação no Brasil começaram a ser definidos. O estágio de conhecimento sobre as novas normas levou a empresa, inclusive, a dar cursos para outras unidades do grupo na América Latina. Pelo fato de esses investimentos terem sido amortizados durante alguns anos, é difícil para as empresas precisarem quanto, especificamente, foi aplicado nessa atividade. “Não se trata de uma questão única, ao longo do tempo foram envolvidos recursos na alocação de profissionais, viagens, sistemas tecnológicos”, ressalta Bruce Mescher, sócio-líder de Global IFRS and Offerings Services (GIOS), da Deloitte. Mas ele calcula que houve um acréscimo de 25% no orçamento ao longo dos anos. Com essa movimentação em torno do IFRS, as auditorias também tiveram de fazer seu próprio dever de casa, o de se adaptar às novas regras.

Veículo: Valor – 31/05/2011