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Justiça consolida aplicação da “modulação” de decisões

Em 2004, o Supremo Tribunal Federal (STF) precisou decidir o destino dos vereadores da cidade de Mira Estrela, no interior de São Paulo. O município havia aprovado, em 1990, uma lei aumentando de nove para onze o número de vereadores da cidade, com apenas 2,6 mil habitantes. O Supremo entendeu que a medida era inconstitucional, mas enfrentou um dilema: se a lei era ilegal, todos os atos aprovados pela Câmara de Vereadores de Mira Estrela desde 1990 – portanto, durante 14 anos – também seriam, o que traria sérios problemas para a administração local. A saída foi “modular” a declaração de inconstitucionalidade, deixando o ajuste para a próxima composição da câmara.

 
Foi a primeira primeira vez em que o Supremo aplicou o mecanismo da modulação, usado para evitar que suas decisões tenham conseqüências desastrosas. De lá para cá, o instrumento foi utilizado outras cinco vezes (veja quadro acima) e a modulação entrou no dia-a-dia das disputas judiciais. No Supremo já há pelo menos três recursos em trâmite que poderão ser alvo de pedidos de modulação ainda em 2009 e alguns tribunais locais, inspirados pela corte, passaram a também aplicar a regra. A modulação vem ganhando espaço principalmente na área tributária: os dois pedidos de modulação julgados em 2008 e os três previstos para 2009 envolvem disputas fiscais.
 
A possibilidade de restringir os efeitos de uma decisão judicial é prevista formalmente apenas na lei que regulamenta a ação direta de inconstitucionalidade (Adin) – a Lei nº 9.968, de 1999 -, mas a modulação só foi aplicada em um processo desse tipo uma única vez, em uma ação contra a contratação de defensores públicos em Minas Gerais, julgada em 2007. De início, muitos magistrados resistiram em levar a modulação a outros tipos de processo, mas a discussão evoluiu rapidamente. No fim de 2007 o Tribunal Regional Federal (TRF) da 5ª Região aceitou a modulação de uma decisão que garantia a isenção da Cofins para a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de Pernambuco. No ano passado, o TRF da 1ª Região proferiu diversas decisões garantindo a modulação em ações sobre a exclusão do ICMS da base de cálculo da Cofins.
 
Já no Superior Tribunal de Justiça (STJ), a modulação foi discutida apenas uma vez, em 2007. A proposta foi levada pelo ministro Herman Benjamin, à época recém-chegado à corte, para dar uma solução conciliatória à disputa em torno do crédito-prêmio IPI. Sua proposta foi derrotada por sete votos a dois, mas a situação vem mudando: José Delgado, um dos ministros que votou contra a modulação na época, admitiu poucos meses mais tarde que poderia rever sua posição sobre o tema.
 
A lei da Adin, assim como a jurisprudência do Supremo, admite que a modulação pode ser acionada para preservar a segurança jurídica ou em casos de excepcional interesse social, dois aspectos freqüentemente presentes em disputas tributárias. Isso porque a jurisprudência é instável na área fiscal e os prejuízos sociais são facilmente contabilizados em bilhões de reais. No ano que vem, podem ser julgados os pedidos de modulação nas disputa em torno do crédito-prêmio IPI e da exclusão do ICMS da base de cálculo da Cofins. Há ainda um debate sobre o quórum necessário para definir a modulação – no caso da incidência da Cofins sobre as sociedades de profissionais liberais – e já em pauta no pleno do Supremo está o “leading case” sobre a cobrança do Imposto Sobre Serviços (ISS) sobre as operações de leasing (leia matéria ao lado).

Veículo: Valor Econômico