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O governo pretende cobrar Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) sobre as operações de leasing, hoje isentas do tributo por não serem consideradas financiamentos. A idéia é dar ao leasing o mesmo tratamento aplicado às demais operações financeiras e, com isso, ajudar a esfriar o ritmo de expansão do crédito, que continua tão forte quanto estavam antes de janeiro, quando o governo tomou uma série de medidas para reduzir o crescimento do crédito e, consequentemente, da demanda na economia.
O Ministério da Fazenda está de olho mais especificamente nas vendas de automóveis, cujos financiamentos migraram quase que integralmente para o leasing. ?? bastante provável, porém, que a alíquota de 3,38% de IOF recaia sobre todos os financiamentos feitos através dessa modalidade, equiparando o leasing, hoje na categoria de contrato de arrendamento mercantil, às demais operações de financiamento. Atualmente o leasing tem prazo mínimo de 24 meses para veículos e de 36 meses para bens com vida útil superior a cinco anos, o que não será um problema, pois o mercado já trabalha com prazos bem mais elásticos.
Em janeiro, o governo aumentou de 1,5% para 3,38% a taxação do IOF sobre operações de crédito, o Banco Central instituiu uma alíquota de compulsório sobre captações feitas pelos bancos por meio de suas empresas de leasing, que começou a vigorar em maio, com implantação gradual até fevereiro de 2009, e em abril o BC deu início ao aperto monetário, com a elevação da taxa básica de juros, a Selic. Apesar dos juros já terem passado de 11,25% para 13% ao ano, as taxas futuras cresceram mais, cerca de 4 pontos percentuais.
Nada disso, contudo, foi suficiente para esfriar a demanda e reduzir a pressão do consumo sobre a inflação. “Está difícil desaquecer a economia”, constatou um ministro em conversa com o Valor.
A incidência do recolhimento compulsório sobre leasing de maio para cá representou um enxugamento de cerca de R$ 10 bilhões nos recursos disponíveis para crédito no sistema bancário. Até fevereiro do próximo ano o compulsório terá recolhido cerca de R$ 40 bilhões, estreitando bastante esse canal por onde desaguou a demanda por financiamentos de veículos.
O volume de financiamento para a compra de carros novos cresceu apenas R$ 2,803 bilhões no primeiro semestre, enquanto as operações de leasing de automóvel, isentas de IOF, cresceram R$ 15,377 bilhões no mesmo período.
Segundo dados divulgados pelo Banco Central, as medidas restritivas de janeiro encareceram os juros, mas não foram capazes de produzir uma desaceleração significativa no ritmo de expansão do crédito, cujo montante pode superar com folga os 40% do Produto Interno Bruto (PIB) esperados pelo BC para este ano. Quando estimou chegar a essa proporção do PIB, o BC considerou que o aumento do crédito este ano seria da ordem de 24%, com uma boa desaceleração em relação ao ano passado. Até o momento, porém, a oferta de crédito cresce na casa dos 32% e seu volume, em junho, correspondia a 36,5% do PIB, considerando os empréstimos a empresas, pessoas físicas e o crédito direcionado.
Tanto técnicos do BC quanto empresários do setor privado avaliam que medidas focadas somente no controle da expansão da oferta de crédito não serão suficientes para desaquecer a demanda, e, para o BC, elas não substituem o aumento dos juros básicos. Por essa ótica, a demanda continuará crescendo a taxas exuberantes, numa economia em que, historicamente, o crédito foi sempre escasso, enquanto houver aumento do emprego e da renda e, sobretudo, não pairar a ameaça de desemprego.
Ao Ministério da Fazenda preocupa tanto o excesso de demanda quanto a possibilidade de errar na dose e dar um tombo no crescimento da economia. Quer-se evitar, assim, que um somatório de medidas tenham seus efeitos sobrepostos no tempo e acabem por derrubar o crescimento dos previstos 5% este ano para a faixa dos 3,5% em 2009.
Outra questão é que para trazer a inflação para o patamar do centro da meta de 4,5% já em 2009 – uma convergência rápida em relação às expectativas – os juros terão que ser mais pesados do que no passado recente, como em 2004 e 2005, quando a forte valorização do câmbio ajudou a conter as pressões inflacionárias. Agora, o câmbio não dará tal contribuição. A performance esperada para a taxa de câmbio é de estabilidade ou desvalorização moderada do real frente ao dólar, o que exigiria atuação redobrada da política de juros.
Na avaliação dos economistas do governo, a atividade econômica já parou de se acelerar e, de agora em diante, tende a se desacelerar. Os sinais mais evidentes desse movimento, contudo, só começarão a aparecer no último trimestre.
A trajetória do PIB que o ministro Guido Mantega tem em mente é de 5% este ano, 4,5% em 2009, voltando para os 5% em 2010. Nesse ritmo, e com bastante cautela na elevação da Selic até dezembro, ele acredita que a inflação cederá – e já começou a ceder por causa da redução nos preços internacionais das commodities – sem que se produza, como dano colateral, uma queda nos investimentos privados. Estes, avalia-se no Ministério da Fazenda, precisam ser preservados a todo custo porque são eles que vão ampliar a capacidade produtiva do país para atender a demanda futura. Os investimentos públicos deram o primeiro impulso, mas o relevante, nesse momento, é não abortar os investimentos privados.
Essa é a razão básica pela qual Mantega busca medidas pontuais, como a do IOF sobre leasing, e teme tanto os efeitos do aumento dos juros. Se houver retração dos investimentos, estará comprometido todo o ciclo de crescimento econômico esperado para os próximos anos.
Veículo: Valor Econômico 1° Caderno 15/8/08 Estado: SP