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A não-aprovação do pacote de socorro aos bancos de US$ 700 bilhões nos Estados Unidos levou as empresas brasileiras a intensificar o movimento de desmonte de posições vendidas em dólar nos mercados futuros. O resultado foi que o dólar chegou a bater nos R$ 2, terminando o dia cotado a R$ 1,9660, seu maior valor desde 5 de setembro do ano passado. A alta foi de 6,21%, a maior registrada desde janeiro de 1999, quando acabou o controle no câmbio no Brasil.
Na BM&FBovespa, os pregões no mercado futuro de câmbio chegaram a parar quando a moeda teve a maior oscilação permitida, de 5%, logo após a notícia da não-aprovação do socorro correr pelo mercado. ??s 15h40, o mercado futuro voltou a funcionar, e o limite de oscilação máximo aprovado para ontem foi de 8%.
As variações bruscas no dólar -que levam a mais perdas pelas empresas brasileiras e maior desmonte de suas posições de caixa- devem continuar, pelo menos até que uma nova saída mais geral para a situação de grave insolvência e falta de liquidez dos bancos dos países ricos seja encontrada, segundo analistas ouvidos pelo Valor. No curto prazo, a moeda pode até passar os R$ 2, acredita Tomás Málaga, economista-chefe do Banco Itaú.
Como até setembro a volatilidade vinha em queda livre desde 2002, assim como o dólar, era fácil para os bancos convencer empresas a vender, à descoberto, opções de compra da moeda americana, diz Felipe Ayres, administrador e diretor da Hilltop Park do Brasil. “O prêmio desta venda era muitas vezes chamado de ‘redutor de custo de dívida’ quando atrelado à uma captação e ‘amplificador de receitas’ quando atrelado à um produto de aplicação financeira”, explica ele.
Como a competição entre bancos estava ficando cada vez mais acirrada, duas tendências se estabeleceram: vender estes produtos para empresas cada vez menores e aumentar cada vez mais a complexidade dos instrumentos, conta ele. “No meio financeiro, alguns instrumentos eram chamados de produtos ‘tarja preta’, como as temerárias dívidas bi-indexadas com ajuste mensal.” Esses ajustes, muitas vezes diários, têm sangrado o caixa das empresas agora, em uma situação de falta de linhas externas. Algumas empresas têm desmontado suas posições, ampliando as perdas com câmbio.
O problema é que as empresas brasileiras, mesmo as grandes exportadoras, tendem a aplicar a maior parte de seu caixa no mercado interno, atraídas pelos polpudos juros em reais. Na busca por liquidez para fazer frente às suas perdas, as companhias acabam vendendo por exemplo Certificados de Depósito Bancário (CDBs) de bancos, principalmente os médios e pequenos, contribuindo ainda mais para o aperto de liquidez no Brasil. A falta de linhas de crédito em dólar e a aversão ao risco, que tende a concentrar o crédito em poucos nomes, tornam o ambiente ainda mais perigoso.
“O Banco Central trouxe algum alívio, ao vender linhas em dólar e reduzir o compulsório para empresas de leasing dos bancos, mas terá de agir um pouco mais”, acredita Málaga. Até agora, o BC fez dois leilões de venda de dólar com compromisso de recompra no total de US$ 1 bilhão. Mudanças de regras para os depósitos compulsórios bancários anunciados no dia 24 injetaram outros R$ 13,2 bilhões de liquidez.
Ontem, o BC vendeu US$ 1,5 bilhão, aproximadamente, no mercado futuro, ao rolar somente US$ 527 milhões de cerca de US$ 2 bilhões em swaps cambiais reversos que vencem no dia 2 de outubro. Nesses contratos, o BC fica comprado em dólar no mercado futuro – recebe a variação da moeda americana mais os juros em dólar no mercado interno (o cupom cambial) e paga a variação do real mais juros em reais aos bancos. Quando não renova as operações, o BC faz o equivalente a uma venda no mercado futuro de câmbio.
O mercado espera mais leilões de venda de dólar com compromisso de recompra, na prática as linhas de crédito em dólar. Dirigente de banco nacional apóia uma atuação até mesmo no mercado à vista. “Uma nova redução nos compulsórios bancários poderia ajudar”, defende Málaga.
Dirigente de banco nacional considera inevitável, no entanto, um movimento de consolidação no sistema financeiro nacional, diante do aperto de liquidez. Os bancos menores que têm grandes operações de crédito no varejo de longo prazo com juros tabelados são os que estão em situação mais difícil, com a alta nos custos de captação e fuga para os CDBs dos bancos maiores.