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Crédito tem, mas paga-se caro

Por Patrícia Duarte

 O mercado de crédito no Brasil encerrou 2008 guardando boas e más notícias para o consumidor. Se, por um lado, houve recuperação do fôlego dos financiamentos — que fecharam o ano em expansão de 31,1%, representando históricos 41,3% do Produto Interno Bruto (PIB) —, por outro os bancos estão segurando os juros em patamares muito elevados. Isso porque, para fazer frente ao maior nível de inadimplência dos últimos seis anos, as instituições financeiras estão aumentando o spread bancário — diferença entre o custo do empréstimo para o banco e o que ele cobra do tomador final. Só em dezembro a alta foi de dois pontos percentuais, alcançando o patamar mais elevado desde setembro de 2004.
 
O spread cobre o lucro dos bancos e todos os seus custos administrativos e financeiros. Portanto, uma alta do calote é compensada nessa rubrica. Como o spread subiu para 45,1 pontos em dezembro, isso praticamente anulou medidas recentes, como o corte no Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) sobre os empréstimos e a queda do custo de captação dos bancos nos mercados financeiros. No quarto trimestre, o avanço do spread foi de 6,5 pontos.
 
Com isso, os juros médios cobrados das pessoas físicas fecharam dezembro a 58%, uma queda de só 0,2 ponto sobre novembro. Em janeiro a taxa já está a 56,6%. Conclusão: crédito tem no mercado. Mas está caro.
 
A inadimplência (atraso superior a 90 dias) chegou a 8,1% para pessoas físicas, a maior desde setembro de 2002 (8,2%). Em relação a novembro, a alta foi de 0,3 ponto. Mas há quem não ache que o movimento dos bancos seja justificado: — Tecnicamente, não tem explicação para essa alta nos spreads. Os bancos estão exagerando — afirmou o vice-presidente da Anefac (associação dos executivos de finanças), Miguel Oliveira, para quem a trajetória de queda dos juros ajudará no futuro.
 
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que tem reclamado dos spreads e do comportamento dos bancos, afirmou ontem: — Nós temos um mercado interno potencial e temos um problema de crédito, para o que eu tenho chamado a atenção. Apesar de o crédito já ter ultrapassado o que era no ano passado, nós achamos que é preciso que as taxas de juros sejam adequadas ao momento histórico que vive o Brasil.
 
Apesar de o custo de captação ter recuado no último trimestre — passando de 14% para 12,6% ao ano na média geral, segundo o Banco Central (BC) —, os bancos não conseguem repassá-lo imediatamente, rebateu o economista-chefe da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), Rubens Sardemberg: — Os spreads subiram porque as taxas de captação caíram mais rapidamente.
 
Isso não acontece de um dia para o outro.
 
Em Zurique, onde participou de reunião do Instituto Internacional de Finanças (IIF) — que reúne os maiores bancos do mundo — Roberto Setubal, presidente-executivo do Itaú Unibanco, disse que os juros dos financiamentos dependerão, daqui em diante, fundamentalmente da inadimplência.
 
Mas informou que as instituições financeiras esperam que o BC promova novos cortes de juros.
 
Ele não descartou que os bancos continuem aumentando os spreads: — Tem que olhar mais para frente.
 
Quando o nível de inadimplência é maior, os spreads tendem a subir. O nível de inadimplência subiu nesses últimos meses.
 
Para as empresas, o spread ficou estável em 18,3 pontos em dezembro, mas avançou 3,6 pontos no trimestre. Em janeiro, até o dia 15, já haviam subido 1,2 ponto, enquanto os voltados para pessoas físicas recuaram ligeiramente: 0,2 ponto. Para o economista da Tendências Bruno Rocha, como o cenário econômico é muito incerto, a tendência dos spreads é de continuarem elevados nos próximos meses.
 
– O desemprego em alta, por exemplo, é um motivo para aumentar o risco. A incerteza é muito grande, e talvez seja difícil precificar isso — afirmou Rocha.
 
Bancos públicos emprestaram mais
 
Em relação ao aumento dos calotes, a inadimplência nos empréstimos para veículos e no cheque especial são as que precisam ser acompanhadas mais de perto. Para o diretor do Departamento Econômico do BC, Altamir Lopes, essas duas modalidades são as que mais puxam os spreads. A inadimplência no cheque especial, em dezembro, voltou para o maior patamar histórico: 10,6%, o mesmo de dezembro de 2007. Para veículos, excluindo as operações de leasing, o índice foi de 4,3%.
 
O país fechou 2008 com volume recorde de crédito de R$ 1,227 trilhão.
 
Lopes projeta um crescimento de 16% neste ano, a 43% do PIB.
 
No ano passado, na carona do direcionamento do crédito determinado por Lula, os bancos estatais elevaram em 39,5% suas operações de crédito no país, para R$ 445,030 bilhões, sendo 12,9% só no trimestre passado. Os bancos privados nacionais avançaram 27,9% no ano e apenas 2,5% no trimestre. Chegaram a R$ 524,726 bilhões. A carteira de crédito dos estrangeiros cresceu 24,5%, para R$ 257,646 bilhões.
 
Colaboraram Tatiana Farah e Deborah Berlinck, enviada especial.

Veículo: O Globo