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Crédito põe em xeque as medidas macroprudenciais

Apesar do entusiasmo do presidente do Banco Central (BC), Alexandre Tombini, com a eficácia das medidas macroprudenciais para conter o crédito, os números ontem divulgados indicam que a desaceleração ainda é fraca.

Quando as medidas macroprudenciais começaram a ser anunciadas, em novembro, ainda no governo passado, o objetivo era reduzir o crescimento do crédito, em uma ação coordenada com a política monetária, para conter a inflação, que já ameaçava descarrilhar. Inicialmente, foi elevado o pagamento mínimo das faturas de cartões de crédito de 15% para 20%. Em dezembro, o Banco Central aumentou as exigências de capital dos bancos para os financiamentos para pessoas físicas e reduziu o prazo do financiamento ao consumo; e o compulsório dos bancos foi ampliado. Neste ano, Tombini deu sequência às medidas, aumentando o IOF do crédito à pessoa física.

A intenção do governo ao recorrer às medidas macroprudenciais é evitar contar com mais instrumentos para conter a demanda, além da elevação dos juros, que tem o efeito colateral de atrair capital externo e apreciar ainda mais o real, o que não é desejável no momento.

No governo Lula, o crédito quadruplicou, acelerando especialmente nos últimos anos. Em 2010, cresceu 20,5%. Para Tombini, o desejável no atual cenário é que o crédito cresça entre 12% a 15%.

No primeiro momento, em janeiro, parecia que o crédito responderia mais significativamente às medidas macroprudenciais. Nos dois meses seguintes, porém, tudo indica que os bancos e os tomadores de crédito se acomodaram às medidas, compensando com um prazo maior a inevitável elevação dos juros.

O saldo das operações de crédito do sistema financeiro, incluindo recursos livres e direcionados, atingiu R$ 1,752 trilhão em março, informou ontem o Banco Central, com crescimento de 1% no mês, 2,7% no trimestre e 20,7% em doze meses, mantendo praticamente o mesmo ritmo de fevereiro, de 1,3%, 3,3% e 20,7%, respectivamente. Com esse resultado, a relação entre empréstimos e Produto Interno Bruto (PIB) ficou igual à de fevereiro, 46,4%, em comparação com 44% um ano antes. Olhando de uma perspectiva mais longa, há motivo para algum otimismo uma vez que, no último trimestre de 2010, o crédito cresceu mais aceleradamente, 5,7%.

As novas concessões de crédito para pessoas físicas caíram de R$ 72,3 bilhões em dezembro, época de vendas infladas pelo Natal, para R$ 65,5 bilhões em janeiro, mas já subiram para R$ 71,8 bilhões em março. O prazo médio das operações com pessoas físicas saiu de 562 dias em dezembro para 559 dias em janeiro e alcançou 566 dias em março. Os juros médios para as pessoas físicas não tiveram volta, porém: de 40% ao ano em dezembro alcançaram 45% em março.

Algumas operações realmente se ressentiram, como o financiamento de veículos. Mas é que o mercado voltou-se para o leasing, que ficou fora das limitações. Outra saída redescoberta foi a volta do cheque pré-datado. É verdade que os bancos ganhariam mais se todo o aperto fosse feito com a elevação da taxa básica de juros.

Mas também é verdade que a eficiência e abrangência das medidas macroprudenciais ainda são um tema de discussão, como ficou claro em estudo apresentado na última reunião do Fundo Monetário Internacional (FMI) pelo economista da organização José Viñals. Os instrumentos macroprudenciais são utilizados há algum tempo por economias emergentes com o objetivo de conter riscos sistêmicos e evitar desequilíbrios no crédito e no câmbio, por exemplo, por meio da criação de reservas contracíclicas, compulsórios, provisões e penalidades, entre outros instrumentos.

Sabe-se que essas medidas, apesar de terem como alvo primário o controle prudencial, têm impacto na demanda, na oferta de moeda e, portanto, na inflação e no ritmo da economia. Não substituem as ações macroeconômicas, mas podem ser coadjuvantes.
Outro trabalho recente a respeito do tema sugere dois campos de investigação. Um deles é estudar a eficiência das ferramentas macroprudenciais na oferta do crédito, alavancagem dos preços dos ativos e das bolhas de modo a evitar a instabilidade financeira. O outro é como a política macroeconômica e a macroprudencial devem ser coordenadas e como interagem.

Veículo: Valor – 28/04/2011