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Rafael Guedes, da Fitch: “Essa postergação da nova norma não é bem-vinda” |
Na semana passada, o Conselho Monetário Nacional (CMN) decidiu adiar, pela terceira vez, agora para 2012, a adoção de uma nova regra contábil que traria de volta para os balanços esses ativos, na maioria crédito consignado e financiamento de veículos cedidos a outros bancos e a fundos de recebíveis (FIDCs). As instituições menores vendem essas carteiras para antecipar receita, captar recursos para novos empréstimos e reduzir sua alavancagem. O adiamento representou um alívio para a liquidez do setor.
Especialistas em contabilidade e analistas de risco criticaram a decisão do CMN, que foi orientado pelo Banco Central. “O balanço deveria mostrar os riscos que existem numa entidade. Ao se fazer a antecipação da receita (no momento da cessão), há uma distorção nos números reais. Por isso, essa postergação de entrada em vigor da nova norma não é bem-vinda”. afirma Rafael Guedes, diretor-executivo da agência de classificação de risco Fitch Ratings no Brasil.
O ex-diretor da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e professor de contabilidade Eliseu Martins disse lamentar a decisão. “Esse é uma assunto bastante relevante e delicado e que já causou problemas sérios no mundo. Pela não adoção de boas regras como essa, descobriu-se que o Lehman Brothers apresentou um balanço não tão próximo da realidade”, afirma.
Pelo que o Valor apurou, ao contrário do que ocorreu nos adiamentos anteriores, que tiveram como motivo a crise, não teria havido unanimidade sobre essa última decisão de prorrogação nem mesmo dentro do BC.
Conforme a percepção de especialistas do mercado, o adiamento pode estar ligado a uma preocupação com a redução dos lucros dos bancos, uma vez que a receita de venda da carteira não seria reconhecida antecipadamente. Segundo Ceres Lisboa, analista de bancos da Moody’s, a nova regra deve levar os índices de retorno sobre patrimônio dos bancos médios a cair de uma faixa entre 20% a 30% para cerca de 12% ou 13% nos primeiros anos. “Adiar a mudança não dá uma solução definitiva. Vou continuar questionando por mais um ano a capacidade desses bancos para rodar essa máquina”, diz ela.
Com as regras vigentes, os bancos que vendem carteiras reconhecem toda a receita da operação, assim como os custos de comissão, no momento inicial. Ao sair do balanço do banco cedente, a carteira de crédito vai para o balanço do banco comprador.
Com as novas regras, o reconhecimento da receita seria feito ao longo do prazo do empréstimo, e a carteira seguiria dentro do ativo do banco vendedor, sob o argumento de que ele mantém a maior parte dos riscos e benefícios ligados ao crédito.
Com a crise global, o Iasb decidiu reavaliar diversas regras sobre instrumentos financeiros, inclusive essa. Uma das possibilidades em estudo seria usar o conceito válido atualmente no Brasil. Para especialistas ouvidos pelo Valor, é difícil imaginar que o Iasb reveja a regra atual, já que o preceito base do IFRS é que a essência deve prevalecer sobre a forma.
Veículo: Valor 05/08/2010