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Isaac, ex-presidente do Federal Deposit Insurance: proposta ‘destrutiva’ |
Você provavelmente já ouviu o provérbio sobre o que é mais importante no mercado imobiliário: localização, localização e localização. O mesmo se aplica para os números que aparecem nas demonstrações financeiras das empresas.
Veja só o ultraje proferido por William Isaac, ex-presidente do Federal Deposit Insurance, depois que o Conselho de Padrões de Contabilidade Financeira (Fasb, na sigla em inglês, órgão responsável pela emissão de normas nos Estados Unidos) anunciou sua proposta para ampliar o uso dos valores de mercado para os instrumentos financeiros, de modo que os empréstimos teriam que aparecer nos balanços dos bancos pelo valor justo.
“Trata-se de uma ideia insuportavelmente destrutiva para ser até mesmo proposta.”
Sobre essa questão, o problema não é se essa informação precisa ser divulgada, e sim onde ela deve aparecer. Observe as notas explicativas do último relatório trimestral do Fifth Third Bancorp, e você verá que o banco revelou que seus empréstimos tinham um valor justo de US$ 70,4 bilhões em 31 de março. Isso é US$ 3,2 bilhões menos que o valor demonstrado no balanço patrimonial, um rombo equivalente a 24% do patrimônio acionário do Fifth Third, de US$ 13,4 bilhões.
Mas ao enterrar as estimativas pelo valor justo nas notas explicativas, onde elas não contam contra o valor contábil ou o capital regulatório, esse e outros bancos em situação parecida se apresentam mais saudáveis do que realmente estão.
Na verdade, o setor está se safando com tranquilidade. Sob a proposta do Fasb, os empréstimos e muitos títulos de dívida seriam mostrados no balanço patrimonial tanto pelos custos amortizados (que incluem ajustes para os pagamentos de principal e perdas contábeis, entre outras coisas) como pelo seu valor justo. As autoridades reguladoras do setor bancário poderão continuar ignorando os valores justos para esses ativos ao estabelecer os indicadores de capital, se assim lhes parecer melhor. Os investidores poderão se concentrar nos números que eles quiserem.
Isso faria do resultado abrangente a nova “última linha”, por assim dizer. Mesmo assim, a proposta do Fasb dá às companhias uma oportunidade de um voleio de relações públicas também aí, porque elas não teriam que apresentar esse número em uma base por ação, da mesma maneira que fazem com o lucro líquido, reduzindo sua importância.
O novo plano do Fasb amplia esse balde. Qualitativamente, porém, a distinção entre o que é incluído no lucro líquido e o que é relegado ao lucro abrangente continua sendo arbitrária.
Os dois conselhos agora estão dizendo que não vão conseguir cumprir o prazo estabelecido [O Iasb e o Fasb dizem que o processo de convergência atrasar porque investidores e companhias estariam preocupados com a velocidade do processo, o que poderia induzir a erros nas demonstrações financeiras].
Isso poderá acabar sendo uma benção. O principal objetivo das demonstrações financeiras sob os padrões americanos supostamente é atender as necessidades dos investidores, e não das autoridades reguladoras do mercado financeiro ou dos administradores de empresas, e muito menos de um orgão político como a Comissão Europeia ou o Partido Comunista da China. Pelo menos agora quando o Fasb pisa na bola é fácil para os investidores americanos entrar em contato com funcionários do conselho e reclamar. Esse é o nível de influência e acesso do quais eles não deveriam abrir mão facilmente.
Jonathan Weil é colunista da Bloomberg. As opiniões expressas neste artigo são pessoais.
Veículo: Valor 14/06/2010