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Tem sequência o possível epílogo acerca da sujeição ativa na tributação sobre as operações de arrendamento mercantil. Tal decisão é aguardada com ansiedade pelo mercado financeiro que pretende, uma vez devolvida a segurança jurídica, voltar a operar com a tranquilidade necessária.
O Superior Tribunal de Justiça, ao abordar a questão, decidiu com respaldo na boa exegese da lei que tal imposto deveria ser recolhido aos cofres da municipalidade onde a arrendadora sedia sua unidade econômica e profissional, pois de lá decorrem os atos concessivos da operação.
Uma vez publicado o acórdão em que a unanimidade dos ministros julgou nesta vertente, o município de Tubarão que, em inúmeras execuções fiscais, por decisões judiciais provisórias, antecipada e precipitadamente já havia levantado e dispendido valores que não lhe pertenciam e que demandavam o enfrentamento da questão, enfim, com o fito de desincumbir-se da devolução dos valores expropriados, interpôs Embargos de Declaração, querendo fazer crer que não teria condições de restituir aquilo que indevidamente recebeu.
Aos que consumiram prematuramente faltou cautela, ante a questão que, a nosso ver, não era polêmica, se bem observado os ditames legais que regulam a matéria.
Assim, arremessando um pouco mais de pó de cal na questão, na última segunda-feira (17/6), foi publicada a tão aguardada e homenageada decisão do ministro Napoleão Nunes Maia Filho revogando sabidamente a liminar anteriormente concedida em atendimento ao pleito formulado em sede do comovente aclaratórios no recurso repetitivo que define a sujeição ativa da incidência tributária do ISSQN sobre operações de arrendamento mercantil.
A liminar, ora revogada, foi concedida com vistas a salvaguardar o município de Tubarão do teórico fundado receio de uma avalanche de ações de repetição de indébito, mormente jamais ter ocorrido um recolhimento voluntário de ISSQN sobre operações de arrendamento mercantil aos cofres de município diverso da prestação de serviços, aptos a ensejar as falaciosas repetições de indébito.
É por bem asseverar que a discussão teve seu nascedouro no Supremo Tribunal Federal, amplamente divulgado no Recurso Extraordinário 592.905, afetado sob a sistemática da repercussão geral, no qual restou assentada a incidência do ISSQN sobre operações de arrendamento mercantil (leasing), na modalidade financeira.
A partir da consagração da incidência, as empresas de arrendamento mercantil, a despeito de efetuarem o recolhimento do ISSQN aos municípios que se situam os locais dos estabelecimentos prestadores de serviços, os quais coincidem com os municípios das suas sedes, exatamente de onde emanam seus atos decisórios e se concentram as unidades profissionais e econômicas, sobrelevavam diversas pretensões fiscais espalhadas pelo Brasil tentando afastar a aplicabilidade desse critério legal e, pior, em caráter dúplice, havia ocasiões de lançamento do ISSQN de um município reputando como local da prestação onde o veículo arrendado foi adquirido, ao passo de outro município entender como local da prestação onde o veículo está licenciado.
Assim, em 2009, objetivando a definição do aspecto técnico-normativo acerca da matéria infraconstitucional, o Recurso Especial 1.060.210-SC foi afetado no Superior Tribunal de Justiça sob a sistemática dos repetitivos e foram alçados dois pontos representativos da controvérsia, a sujeição ativa (local da prestação) e a base de cálculo da tributação da regra matriz da incidência tributária, com o fito de salvaguardar o direito de as empresas de leasing não se submeterem a tributação em duplicidade, triplicidade e até em quadruplicidade.
Impende salientar que o leasing ou arrendamento mercantil, como é conhecido no Brasil, é um dos maiores mecanismos de fomento à economia nos países desenvolvidos.
No Brasil, o instituto, nos últimos dez anos, foi alvo de hostilidades interpretativo-jurídicas pelos tribunais estaduais e inclusive pela Corte Cidadã, fatores que abalaram substancialmente a oferta do produto, de modo que, atualmente, as empresas de leasing estão com as operações suspensas até que se defina se ao produto será devolvida a tão perseguida segurança jurídica.
A vulnerabilidade e complexidade de compreensão do instituto entusiasmaram bancas de advogados a capitanearem um sem-número de municípios, inicialmente no sul e, hoje, em extensão ao norte e nordeste do país, visando a contratação e a delegação do munus público na arrecadação do ISSQN, com a consequente repercussão proporcional à verba honorária envolvida, a partir da cobrança de milionários “créditos tributários” constituídos em autos de infração produzidos, encaminhados e julgados pelos próprios ilustres procuradores privados.
Notadamente, a discussão cinge-se na contenda entabulada por bancas de advogados privados contra empresas de arrendamento mercantil que, motivados pela Lei Federal 10.819/2003, a qual permite o levantamento do depósito judicial (realizado coercitivamente em execuções fiscais) na ordem de 70%, antes do trânsito em julgado, possuem dantesco atrativo pelo consequente reflexo da verba honorária considerada sobre o erário, paga antecipadamente.
Extrai-se que não estamos diante de uma disputa tributária entre os ditos “frágeis” entes municipais e as “vilãs” empresas de arrendamento mercantil, conforme se ostenta equivocadamente, tampouco em face de “sonegadoras de tributos”, haja vista que o recolhimento do ISSQN fora feito consoante dispunha os aspectos técnicos-normativos do diploma legal que rege a matéria, inicialmente o Decreto-lei 406/1968 e, posteriormente, a Lei Complementar 116/2003, cuja interpretação foi definida em iguais termos, em 28de novembro de 2012, por unanimidade, após seis meses de ampla e divulgada discussão pelos ministros do Superior Tribunal de Justiça.
Com efeito, por se tratar de recurso com sistemática repetitiva, conforme disciplina o artigo 543-C do diploma processual civil e Resolução 8/2008, tem como ratio essendi cumprir o desígnio constitucional do Superior Tribunal de Justiça, qual o de uniformizar a jurisprudência dos tribunais do país, e evitar a sobrecarga dos colegiados com a remessa reiterada de impugnações contrárias ao entendimento firmado no apelo representativo.
Neste desiderato, a Lei 11.672/2008 foi enfática no sentido de que a irradiação dos efeitos do decisum vazado sob a sistemática uniformizadora é imediata à publicação do acórdão, de modo que o Superior Tribunal de Justiça assim já vem adotando o resultado do REsp 1.060.210-SC em um sem-número de casos.
Assim, não subsistia válida qualquer motivação legal, quiçá social, para manutenção da liminar inédita concedida pelo ministro Relator Napoleao Nunes Maia Filho sustando parcialmente os efeitos do acórdão em afronta ao próprio dispositivo que regula os repetitivos, certamente motivado pelas infundadas e inverídicas razões colacionadas em sede de embargos de declaração pelo município de Tubarão no sentido que haveria uma avalanche de ações de repetição de indébito, assertiva falaciosa à medida que nunca houve recolhimento voluntário por parte das empresas de arrendamento mercantil aptos a ensejar a repetição de indébito, de sorte que a manutenção da ordem liminar somente tinha o condão de malferir, mesmo que parcialmente, a autoridade e uniformidade interpretativa do julgado, bem como sua finalidade institucional de erradicar a reprodução reiterada da controvérsia em recursos dessa natureza.
Adriana Serrano Cavassani – Revista Consultor Jurídico